Estudo sugere mudança na classificação da COVID-19 para destacar os quadros de trombose na doença

Por Redação, Agenda News

Publicado em 04/05/2021 08h44

Estudo sugere mudança na classificação da COVID-19 para destacar os quadros de trombose na doença Reuters/direitos reservados/ por EBC
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Desde que tiveram início os casos de contaminação pelo novo Coronavírus, cientistas e pesquisadores de todos os países se debruçaram em estudos que pudessem elucidar a ação do vírus no organismo, na tentativa de encontrar métodos de prevenção e de tratamento eficazes. Focado em entender as especificidades da COVID-19, um grupo de pesquisadores brasileiros sugere a mudança na classificação da doença, uma vez que foram identificadas particularidades de ação desse vírus no organismo diretamente relacionadas à coagulação sanguínea, na forma de trombose, que se manifesta em diversos órgãos, do cérebro ao aparelho gastrointestinal.

 

“No dia 20 março de 2020, montamos um grupo multidisciplinar, formado por médicos intensivistas e hematologistas, pesquisadores de área básica (farmacologia, virologia, imunologia e biologia molecular) e pesquisadores em modelagem molecular. Discutindo a COVID- 19, fomos colocando as ideias sobre a nova doença e os médicos nos enviavam informações sobre os quadros clínicos de seus pacientes. Assim, surgiu a observação de que essa doença é muito mais complexa do que imaginávamos. Em grande parte dos casos graves, o paciente evolui com trombose. O que não é usual na SARS (Síndrome Respiratória Aguda Grave)”, explica José Mengel, pesquisador da Faculdade de Medicina de Petrópolis (UNIFASE/FMP) e da Fiocruz.

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A observação sobre a evolução dos quadros de trombose chamou a atenção do grupo de pesquisadores, formado por especialistas de seis renomadas instituições de assistência médica e pesquisa científica: Faculdade de Medicina de Petrópolis (UNIFASE/FMP), Fiocruz Paraná (Instituto Carlos Chagas), Hospital Pró-Cardíaco, IOC/Fiocruz (Instituto Oswaldo Cruz), Inca (Instituto Nacional do Câncer) e United Health Group. Os profissionais começaram a trabalhar em cima dos dados apresentados, tentando entender a ação do novo vírus no organismo.

 

“Decidimos escolher os estudos focados no desenvolvimento dos quadros de trombose, para entendermos com maior clareza, pois essa hipótese ainda não tinha sido levantada, mas inegavelmente era o que estava acontecendo na beira do leito. A partir da sugestão do Dr. Rubens Costa, iniciou-se a investigação sobre quais mecanismos poderiam ser responsáveis pela indução da trombose e desenhamos um quadro com várias possibilidades”, destaca o pesquisador. 

 

No artigo recém-publicado na revista científica Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, o grupo de cientistas defende que o novo Coronavírus seja o primeiro agente reconhecido por atuar no organismo aumentando sobremaneira a formação de trombos que podem obstruir a circulação do sangue. O estudo, baseado em pesquisas realizadas em vários países, aponta altos índices de complicações ligadas à formação excessiva de coágulos na corrente sanguínea.

 

“Essas possibilidades foram publicadas agora, classificando ou tentando mudar o nome da doença para Febre Viral Trombótica. Na verdade, esse nome COVID-19 é uma denominação neutra, sem nenhum carimbo. Quando temos uma doença com uma classificação que envolve um determinado fenômeno, é um aviso importante para os médicos, para que saibam que estão lidando com uma doença que potencialmente gera trombose. Há um tempo, a gente sabia que existia um estado de hiperinflamação nessa doença e todo mundo começou a trabalhar para tentar controlar esse quadro. Acontece que essa hiperinflamação também é acompanhada de uma hipercoagulabilidade do sangue, ou seja, algumas coisas que favorecem o aparecimento de trombose. A nomenclatura adequada é muito importante na área científica, pois quando se classifica a doença com base na observação, se melhora o entendimento do quadro clínico e chamamos a atenção das pessoas que estão tratando e cuidando desse tipo de doença para o ponto em que mais precisam ficar atentas”, frisa Mengel.

 

A COVID-19 tem algumas particularidades. Em relação aos quadros em que o paciente apresenta trombose, muitos já haviam passado pelo quadro clínico agudo da doença e só tiveram a formação de trombos meses após terem contraído a doença.

 

“Que a gente tenha conhecimento, essa é a primeira doença viral que causa esse tipo de alteração, com essa frequência. Tem alguma coisa na COVID-19 que, a gente ainda não entende completamente e que leva a esse tipo de padrão. Existem outras viroses que causam hemorragia, mas a COVID-19 é a primeira doença viral em que a incidência de trombose é muito alta. Essa é a primeira doença em que na maior parte dos quadros graves observa-se algum tipo de fenômeno trombótico. É uma constatação clínica frequente, que no decorrer do tempo vai levar a novas formas de tratamento. A gente já constata que esses fenômenos tromboembólicos podem ocorrer depois da fase aguda da infecção, quando alguns pacientes permanecem com sintomatologia, caracterizando uma “fase crônica da COVID”, que estamos chamando agora de COVID longa. Esta forma da patologia pode envolver fenômenos tromboembólicos meses depois da cura da fase aguda”, pontua.

 

O pesquisador destaca que a trombose é um quadro agudo que, se não for devidamente cuidado, pode levar à morte. Existem alguns tipos de trombose. Na trombose venosa profunda, o trombo se forma numa veia de grande calibre e pode migrar e ocluir, por exemplo, a artéria pulmonar, impedindo toda a oxigenação do sangue e a troca gasosa.

 

“É extremamente interessante do ponto de vista científico, pois é uma doença que desenvolve a trombose, como uma de suas principais características. Inclusive, esse quadro pode ser prolongado depois da fase aguda e só aparecer trombos meses depois. A ideia inicial do nosso trabalho era levantar as principais hipóteses para serem testadas experimentalmente. Agora, existe uma série de laboratórios, com profissionais muito competentes, trabalhando para comprovar ou não as hipóteses levantadas neste estudo. É assim que funciona a ciência. Se não conseguirem mostrar que estamos errados, significa que podemos estar certos. A partir desses resultados, teremos uma delineação do caminho a ser seguido e uma explicação para os mecanismos, o que pode levar a algum avanço terapêutico no caminho de bloquear o aparecimento de trombose”, finaliza o pesquisador.



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